O sistema prisional brasileiro possui a terceira maior população carcerária no mundo. São mais de 750 mil pessoas coexistindo sob condições desumanizadoras, caracterizadas pelas mais diversas violações de direitos. Quase metade dessa população é composta por pessoas que ainda não foram sentenciadas e, portanto, aguardam julgamento presas provisoriamente.
Ademais, a seletividade na atuação do Judiciário e dos agentes de segurança pública é responsável pela configuração de um perfil comum dentre as pessoas aprisionadas: seus corpos são, majoritariamente, já afetados pelas desigualdades sociais e étnico-raciais presentes na sociedade brasileira, realidades aprofundadas pela prisão.
Dentre a enorme problemática carcerária, a superlotação das unidades prisionais merece destaque em momentos como o atual, em que uma pandemia assola o Brasil e o mundo. A coexistência de diversas pessoas em um espaço mínimo acentua uma série de complexidades desumanizadoras, como a falta de acesso a materiais de higiene pessoal, à assistência médica e ao suporte adequado de medicamentos, sem contar o racionamento de água e a alimentação de baixo valor nutricional.
Tais insalubridades, além de contribuírem para o agravamento de doenças preexistentes, também fortalecem um ambiente propício à proliferação de doenças infectocontagiosas, as quais se alastram em escala incontrolável. Também são de conhecimento público as constantes denúncias que expõem a intrínseca tortura física e psicológica dentro das unidades prisionais, que aflige os corpos das pessoas presas.
Diante desse cenário, em 2015, no âmbito da ADPF 347, o próprio Supremo Tribunal Federal reconheceu que a questão do cárcere deve ser encarada como um Estado de Coisas Inconstitucional, o que significa reconhecê-lo como um contexto de violações generalizadas, contínuas e sistemáticas de direitos fundamentais.
No entanto, apesar de enfrentarmos, atualmente, a arrasadora pandemia do COVID-19, o Supremo Tribunal Federal, no dia 18 de março, negou pedido apresentado pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa – IDDD na referida ADPF 347, que objetivava a concessão de penas e medidas alternativas às pessoas presas que fazem parte do grupo de risco à contaminação. Pessoas com mais de 60 anos ou com doenças preexistentes, lactantes e gestantes que, por lei e segundo a jurisprudência do próprio Supremo, poderiam cumprir suas penas em condições diversas do ambiente prisional, tiveram o risco iminente às suas vidas colocado ao abrigo das instâncias locais, sob a orientação da Recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça.
Como fica cada dia mais evidente diante das notícias sobre a pandemia, o contexto demanda atuação conjunta e coordenada de todas as instituições envolvidas e responsáveis pelo bem-estar social. Neste sentido, o Judiciário, a partir de suas decisões, pode interferir em funções executivas e legislativas com repercussões, sobretudo, humanitárias.
Por esse motivo, as figuras públicas, os profissionais de expertise na área e as organizações que subscrevem a presente nota conclamam que o Supremo Tribunal Federal exerça sua competência de zelar pelas garantias constitucionais, tomando providências concretas no sentido de determinar o desencarceramento dos grupos mais vulneráveis à pandemia do COVID-19.
Assinam:
Figuras públicas e profissionais de expertise na área
- Alessandra Teixeira, professora adjunta da Universidade Federal do ABC (UFABC) e dos Bacharelados de Ciências e Humanidades e de Políticas Públicas
 - Davi Tangerino, Advogado e professor da FGV/SP
 - Eliza Odila Conceição Silva Donda, advogada
 - Eugênio Aragão, ex-Ministro da Justiça
 - Fernanda Maria Vieira, advogada e professora da UFRJ
 - José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça
 - José Eduardo Cardozo, ex-Ministro da Justiça
 - Maria da Conceição Andrade Paganele Santos, advogada
 - Natália Corazza Padovani, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero Pagu/UNICAMP
 - Renato Vieira, advogado
 - Thales Arcoverde Treiger, Defensor Público Federal
 
Organizações da sociedade civil
- ABRACRIM – AL – Leonardo de Moraes Araújo Lima
 - ABRACRIM – AM – Cândido Honório Soares Ferreira Neto
 - ABRACRIM – BA – Fernando Santos
 - ABRACRIM – CE – Ligia Peixe
 - ABRACRIM – DF – Fernando Parente dos Santos Vasconcelos
 - ABRACRIM – ES – Homero Junger Mafra
 - ABRACRIM – GO – Alex Araújo Neder
 - ABRACRIM – MA – Erivelton Lago
 - ABRACRIM – MG – Deiber Magalhães
 - ABRACRIM – MS – Alexandre Franzoloso
 - ABRACRIM – MT – Michelle Marie de Souza
 - ABRACRIM – PA – Marcus Valerio Saavedra
 - ABRACRIM – PB – Sheyner Yàsbeck Asfóra
 - ABRACRIM – PE – Emerson Davis Leonidas Gomes
 - ABRACRIM – PR – Andrey Salmazo
 - ABRACRIM – RJ – Thiago Minagé
 - ABRACRIM – RN – Aquiles P P Melo
 - ABRACRIM – RO – Aisla de Carvalho
 - ABRACRIM – RS – Raccius Potter
 - ABRACRIM – SC – Hélio Rubens Brasil
 - ABRACRIM – SP – Antonio Belarmino Jr
 - ABRACRIM – TO – Sibele Biazotto
 - ABRACRIM – AC – Thalles Vinícius de Souza Sales
 - ABRACRIM – AP – Lucidéa Portal Melo de Carvalho
 - Além das Grades – Pernambuco
 - Amparar – Associação de Familiares e Amigos de Presos/as (São Paulo)
 - Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
 - Associação Atados
 - Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas – ABRACRIM Nacional
 - Associação de Juízes para Democracia – AJD
 - Associação de mães e amigos da criança e adolescente em risco – AMAR
 - Associação de Mães, Familiares e Amigos de Presas e Presos do Rio Grande do Norte
 - Associação Juízes para a Democracia
 - Cendhec – Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social
 - Central de Cooperativas Unisol Brasil
 - Centro Acadêmico 22 de Agosto
 - Centro Acadêmico XI de Agosto
 - Centro de Defesa de Direitos Humanos “Carlos Alberto Pazzini”
 - Centro de Direitos Humanos e Educação Popular de Campo Limpo/Cdhep
 - Centro de Estudos de Segurança e Cidadania – CESeC
 - Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
 - Coletivo Fala Alto – Pernambuco
 - Coletivo Por Nós – Mulheres Sobreviventes do Cárcere (SP)
 - Coletivo Rosas no Deserto: Familiares, Amigas/os e Egressos e Egressas do Distrito Federal
 - Comissão de Defesa do Estado Democrático de Direito da OABRJ
 - Comissão de Direitos Humanos da OABRJ
 - Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo CDHPF
 - Conectas Direitos Humanos
 - Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo
 - Conselho Nacional de Ouvidorias Externas das Defensorias Públicas estaduais
 - Conselho Regional de Psicologia do RS
 - DDH – Instituto de Defensores de Direitos Humanos
 - Departamento Jurídico XI de Agosto
 - Diocese Cel. Fabriciano, Itabira – MG, José Carlos de Paula
 - Fórum Grita Baixada
 - Frente Distrital pelo Desencarceramento – Distrito Federal
 - Frente Estadual pelo Desencarceramento RJ
 - GAJOP-Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares
 - Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas de Segurança Pública e Administração da Justiça Penal da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (GPESC-PUCRS)
 - Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (GPVC-UFRGS)
 - Grupo Tortura Nunca Mais – SP
 - INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos
 - Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas – INNPD
 - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM
 - Instituto de Criminologia e Política Criminal – ICPC
 - Instituto de Cultura e Consciência Negra Nelson Mandela
 - Instituto de Defesa do Direito de Defesa – IDDD
 - Instituto de Defesa dos Direitos Humanos – IDDH
 - Instituto de Estudos da Religião – ISER
 - Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB
 - Instituto das Irmãs da Santa Cruz
 - Instituto Latino Americano de Direitos Humanos – ILADH
 - Instituto para Desenvolvimento de Ações Sociais – IDEAS
 - Instituto Pro Bono
 - Instituto Sou da Paz
 - Instituto Terra, Trabalho e Cidadania – ITTC
 - JusDh – Articulação Justiça e Direitos Humanos
 - Justiça Global
 - Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ
 - Liberta Elas – Pernambuco
 - Mecanismo Estadual de Combate e Prevenção à Tortura do Estado do Rio de Janeiro
 - MNDHPol – Movimento Nacional Direitos Humanos de Policiais
 - Movimento da Advocacia Trabalhista Independente – MATI
 - Movimento Mulheres Negras Decidem – RJ
 - Movimento Nacional de Direitos Humanos MNDH Brasil
 - Movimento Negro Unificado – MNU
 - Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP)
 - Núcleo de Migração LGBTQIA da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/SP
 - Ong EuSouEu – Reflexos de uma Vida na Prisão
 - Ouvidoria Externa da Defensoria Pública do Estado do Acre.
 - Ouvidoria Externa da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro
 - Ouvidoria Geral Externa da Defensoria Pública do Estado do Pará
 - Ouvidoria Geral Externa da Defensoria Pública do Maranhão
 - Pastoral Carcerária Nacional
 - Plataforma Brasileira de Política de Drogas – PBPD
 - Plataforma DHESCA Brasil
 - ProMigra – Projeto de Promoção dos Direitos dos Migrantes
 - Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
 - Rede Feminista de Juristas – deFEMde
 - Rede Justiça Criminal
 - Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo – SASP
 - Sociedade Brasileira dos Advogados Criminalistas – SACERJ
 - Vivat Brasil