Começamos a atuar na frente de advocacy no fim de 2014. O quadro que encontramos na diplomacia brasileira pode ser descrito como de mudez conservadora. Entendemos o processo UNGASS-2016 – a assembleia geral da ONU que debaterá exclusivamente política de drogas – como uma oportunidade para reestruturar a narrativa diplomática do Brasil sobre o tema. Estabelecer um diálogo entre a sociedade civil e nossa diplomacia é crucial para cumprir o objetivo de destravar a posição do Brasil nas discussões sobre drogas. Especialmente em relação à UNGASS-2016 nosso objetivo é buscar a aproximação da diplomacia brasileira com países que advogam novas abordagens em segurança e saúde, como México, Colômbia e Guatemala, que têm sido os principais articuladores diplomáticos dessa discussão sobre drogas nas Nações Unidas.
Para tanto, definimos uma série de ações estratégicas e participamos de eventos-chave para a construção dessa nova narrativa política:
1 – Agrupar atores governamentais importantes e parceiros nos órgãos governamentais.
Estabelecemos parcerias com UNIODC – Brasil (escritório da ONU para drogas e crime), SDH-PR, SENAD- MJ e Ministério da Saúde (Aids e Saúde Mental). Com isso, estabelecemos parcerias para a discussão qualificada com órgãos de saúde, justiça e direitos humanos no Executivo sobre as questões que serão tratadas no processo UNGASS-2016.
A narrativa que propusemos para avançar nas discussões, em especial junto ao Itamaraty, é a de que a discussão do tema deve escapar do falso dilema de ser a favor ou contra as drogas e incorporar três argumentos: a) defesa da soberania dos países para possível experimentação de diferentes abordagens para o problema; b) defesa das perspectivas de direitos humanos e de políticas públicas concorrentes para a construção de práticas em segurança a atenção sanitária; c) defesa do argumento de que a discussão visa garantir a paz sustentável, tanto no âmbito da relação internacional como em políticas internas.
2 – Construindo o mandato junto à diplomacia em parceria com a sociedade civil internacional.
Estivemos na primeira reunião de entidades da sociedade civil com vistas à UNGASS, promovida pelo IDPC (International Druga Policy Consortium) e pela Open Society Foundation em janeiro de 2015 em Nova York. Passamos a integrar oficialmente o New York NGO Group – UN (Grupo de Organizações Não Governamentais para atuar junto à ONU).
Na mesma oportunidade, tivemos audiência com o embaixador Antônio Patriota, chefe da Missão Brasileira na ONU. O embaixador está sensibilizado sobre a importância de debater as atuais políticas de drogas. Nesse sentido, foram fundamentais os diálogos realizados anteriormente pelos membros da PBPD Instituto Igarapé, CONECTAS e ABRAMD. No encontro, o tema da paz sustentável e da soberania para buscar novos modelos de políticas foi estabelecido como centro da linha diplomática. Estabeleceu-se também um compromisso das Missões junto à ONU para, mais do que ter uma sinalização pública do Brasil, estabelecer diálogos com países que estão buscando rediscutir as convenções sobre drogas, como México, Guatemala e Colômbia.
3 – UNGASS Special Segment Meeting e Commission on Narcotic Drugs (CND) 58th Session, em Viena.
Em Viena, a Plataforma foi representada por seu Secretário Executivo, Cristiano Maronna, e por Aldo Zaiden. As credenciais foram cedidas por um dos membros da CONECTAS – Direitos Humanos. Principais pontos sobre a reunião:
- A delegação da sociedade civil e os diplomatas brasileiros se articularam pela primeira vez e estiveram em comunicação com a Missão em Genebra para uma Sessão da CND;
- Os representantes do Ministério da Saúde tiveram voz ativa junto à missão em Viena, fato não observado anteriormente. Puderam realizar declarações no plenário sobre os temas da garantia de direitos e da redução de danos como estratégia fundamental;
- Em sua principal declaração, pronunciada em plenário pelo Embaixador Evandro Didonet, chefe da missão, ficou mais clara a adesão do Brasil aos novos enfoques, mostrando-se a favor da realização de uma discussão sobre novas políticas em segurança e saúde no debate internacional;
- Muitas outras declarações foram feitas pela Delegação Brasileira, que também patrocinou eventos paralelos sobre a pena de morte. Destaca-se também uma importante fala feita pelo Ministério da Saúde sobre AIDS e redução de danos nos contextos de uso do crack;
- A preocupação com o crescente encarceramento foi objeto de debate do qual surgiu a resolução L08. Deve-se descriminalizar o porte e o uso, e alternativas ao encarceramento devem ser aplicadas para crimes não violentos, incluindo o de pequeno tráfico;
- Contrariamente à posição europeia e de boa parte dos países asiáticos, a diplomacia brasileira defendeu que processo UNGASS-2016 tivesse ampla participação da sociedade civil. Além disso foi defendido que o processo fosse alimentado pelo conjunto dos organismos da ONU, que teriam liberdade de agenda para oferecer seu subsídio à Assembleia. Infelizmente, prevaleceu uma resolução (L.12) que confere grandes poderes a Viena no processo. O Brasil também se posicionou contra o aumento das listas de proibição, diante da pressão de alguns países pela inclusão de novas drogas como a ketamina, por exemplo. Também apoiou resoluções sobre liberdade de pesquisa com drogas ilícitas;
- Foram feitas reuniões entre a diplomacia brasileira e representantes do México, do Uruguai, da Guatemala e da Colombia, acertando passos e apoios mútuos para a agenda;
- A PBPD participou do evento “O Impacto das Políticas de Drogas no Direitos Humanos na América Latina”, realizado por parceiros do México (Espolea) e da Argentina (Cels e Intercâmbios). A exposição da perspectiva nacional ficou a cargo de Cristiano Maronna. O embaixador e outros diplomatas do Brasil em Viena estiveram presentes.
4 – 28a Sessão do Conselho e Direitos Humanos da ONU
Após o fim dos eventos em Viena, juntamo-nos aos parceiros da CONECTAS e da Global Commission on Drug Policy, em Genebra. O Brasil entrou no “core group” de uma resolução para que se organize um painel especial sobre UNGASS-2016 e um informe do Conselho de Direitos Humanos a ser apresentado à Assembleia Geral para a CND. Estar no “core group” significa o mais alto nível de apoio de um país à uma resolução. A resolução foi aprovada restando agora incidir no Painel e no Relatório. Para tanto, contaremos com as articulações já estabelecidas em parceria com a missão em Genebra, o IDPC e a Global Commission.