Por Gabriel Santos Elias
Essa semana, especialistas em política de drogas do Brasil e da América Latina, além do Secretário-Geral da Unasul se reuniram em Brasília para debater o contexto regional da política de drogas e os desafios para transformar as diretrizes da política de drogas global em 2016. O evento assumiu uma importância especial, considerando a liderança da América Latina no debate a nível global, e evidenciou a necessidade de um posicionamento mais atuante do Brasil.
A última UNGASS sobre drogas, realizada ainda em 1998, declarava o irreal objetivo de alcançar “um mundo livre das drogas”. Mesmo com o alto custo social deste objetivo, baseado na militarização da segurança pública, altos índices de violência e encarceramento, este ainda foi ratificado em 2008, com um plano de trabalho para acabar com ou reduzir significativamente a produção, o comércio e o consumo de drogas no mundo. A América Latina foi fundamental para marcar uma virada nesse entendimento. A nossa região é uma das que mais sofrem com os impactos nocivos da “guerra às drogas”, como foi apresentado por Sérgio Chaparro, da organização DeJusticia, da Colômbia. Por isso, foi daqui que surgiu o chamado global para repensarmos essa política. Assim, em 2012, México, Colômbia e Guatemala solicitaram a realização de uma Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU para discutir possíveis mudanças nas diretrizes internacionais sobre essa política, no que foram apoiados por 95 países.
A UNGASS 2016 acontecerá em um contexto em que a região experimenta o primeiro modelo de regulação da produção e comércio de maconha em nível nacional, no Uruguai, como nos foi relatado no evento pelo ex-secretário de política de drogas do país e atual assessor da Unasul, Julio Calzada. Também foi relevante o questionamento feito em 2011 pelo Governo da Bolívia à convenção sobre drogas de 1961 para permitir o consumo tradicional de folha de Coca no país, a primeira vez que a convenção proibicionista foi questionada formalmente.
A América Latina tem sido uma grande liderança na mudança da política de drogas em nível global, o que tem contribuído para pressionar por mudanças também no Brasil a nível nacional. Na última contribuição para a UNGASS o país defendeu adoção de critérios objetivos para distinção entre usuários e traficantes. O Brasil também assinou a contribuição da Unasul, liderada pelo ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper, também presente no evento, que defende a descriminalização das drogas nos países. Estes são alguns dos temas que estão sendo discutidos no âmbito do julgamento do R.E 635.659, no Supremo Tribunal Federal.
Agora é importante que o Brasil assuma seu papel de liderança regional e contribua de forma mais pró-ativa com o debate global para afirmar, na UNGASS 2016, políticas de drogas baseadas nos princípios de direitos humanos e da atenção à saúde integral das populações, e não na militarizada guerra às drogas ainda hoje prevalecente e que tantos danos traz ao nosso país e região.